“Uma civilização democrática só se salvará se fizer da linguagem da imagem uma provocação à reflexão e não à hipnose”

Processo de criação do livro “Tramas: sobre caminhos e encontros”.
A imagem e a comunicação na era das redes sociais, em um bate-papo com Simonetta Persichetti, crítica de fotografia, jornalista, professora e curadora do livro “Tramas: sobre caminhos e encontros”.
Pensar em fotografia na era das redes sociais rende uma infinidade de debates. Mas para evidenciarmos as principais mudanças, o que você enxerga de mais positivo nesse turbilhão de imagens que atravessam o nosso olhar diariamente? E, no caminho oposto, quais os principais danos que essa saturação de imagens pode causar?
Boa pergunta. O que eu vejo de mais positivo é a possibilidade de nos interligarmos com pessoas do mundo todo e conhecermos de forma mais ou menos rápida trabalhos de profissionais que, sem as redes sociais, possivelmente seria impossível, ou demoraríamos muito a conhecer. Por outro lado, como vocês dizem, neste turbilhão perdemos nossa capacidade de enxergar. Será que estamos mesmo vivenciando produções e trabalhos ou só estamos vendo manchas coloridas? De uma maneira geral acho que estamos nos tornando não videntes. As imagens deslizam por nós e são poucas as que conseguimos fixar.
Falar muito e ouvir pouco é um sinal dos nossos tempos, o que diz bastante sobre a comunicação nada aprofundada dos dias de hoje. Mas o trabalho da Nitro, em especial o conjunto de imagens apresentado no livro “Tramas: sobre caminhos e encontros”, parece ir em outra direção. O que esse trabalho diz sobre a fotografia, e o que ele pode apontar, também, para a comunicação?
O trabalho da Nitro é incrível. Eles trabalham no silêncio das imagens. Aprofundando temas com muita poesia e não simplesmente sobrevoando assuntos. A Nitro acredita nas histórias que quer contar. Realmente eles acham que estas narrativas – no bom sentido da palavra – podem nos chamar para uma reflexão. Gosto muito de uma frase do Umberto Eco: “uma civilização democrática só se salvará se fizer da linguagem da imagem uma provocação à reflexão e não à hipnose”. Ele escreveu isso nos anos 1960. Acho que é muito atual. E eu acredito que é desta forma que a Nitro pensa seus projetos: um convite a reflexão.
Ainda sobre o livro, como curadora, qual foi a linha de pensamento que você usou para escolher as imagens mais simbólicas dessas mais de duas décadas de produção? Compartilhe como foi esse processo criativo.
Bom, foi um processo coletivo ao qual fui gentilmente convidada pela Nitro. Tentei entrar na ponta dos pés (não sei se consegui, kkkk). O tempo todo trabalhamos juntos e eu procurei ouvi-los para entender como eles mesmos viam suas produções, suas pautas, como pensavam seus projetos criativos. São quatro fotógrafos com linguagens diferentes e que de alguma maneira tem suas imagens costuradas pela poética do Gustavo Nolasco. A ideia foi construirmos uma unidade entre os trabalhos do Leo Drumond, do Marcus Desimoni, do Bruno Magalhães e do João Marcos Rosa. Afinal, cada um tem sua especificidade, mas estão contando todos a mesma história: nossa trajetória por esta vida. Nossa passagem pelo mundo. E isso não é pouco!